Empresas dos mais variados portes especializadas em economia circular e logística reversa têm expandido as suas atividades a partir do Paraná e colaborado com os índices que fazem com que o Estado seja considerado o mais sustentável do Brasil. Além de iniciativas das próprias instituições privadas, políticas públicas geridas pelo executivo estadual têm ajudado a estimular o setor, que demonstra claros sinais de que está em franco crescimento.
Diferentemente do modelo linear, caracterizada pela extração de insumos para produção, consumo e descarte, a economia circular visa conservar o valor dos recursos extraídos e produzidos, mantendo-os em circulação por meio de cadeias produtivas integradas. O modelo prioriza o reaproveitamento, reparo, reúso e a remanufatura de resíduos.
A Circle Economy, entidade apoiada pela Organização das Nações Unidades (ONU), projeta um aumento de 8,6% para 17% na proporção de materiais reutilizados até 2032, o que geraria uma redução de 39% nas emissões de gases do efeito estufa no período. Outro dado relevante é do Relatório Global de Economia Circular da consultoria multinacional Accenture, que aponta que transição para um modelo de economia circular poderia gerar uma economia de até US$ 4,5 trilhões até 2030 no mundo.
Uma das referências mais recentes do segmento no Paraná é a Packem, empresa especializada na reciclagem de grandes embalagens, e que investiu R$ 75 milhões para a instalação de no de uma fábrica de 9 mil metros quadrados na Cidade Industrial de Curitiba, inaugurada no início de abril. A estrutura, construída em uma área total de 35 mil metros quadrados, tem capacidade para reciclar 1,2 bilhão de garrafas pet por ano.
Na última terça-feira (16), a Packem inaugurou uma nova unidade produtiva na Índia, em parceria com uma empresa local, em um evento que contou com a participação do governador Carlos Massa Ratinho Junior durante missão internacional ao país asiático. Assim como a unidade paraense, a fábrica indiana transformará o material coletado nas chamadas big bags, que são grandes embalagens flexíveis usadas para transporte ou armazenamento de produtos em pó, a granel ou líquidos, como fertilizantes, alimentos, minérios ou sementes.
“Sabemos o grande problema que o lixo plástico representa ao planeta, por isso nos debruçamos em pesquisa para criar um material totalmente sustentável. Por isso trabalhamos com todos os elos dessa cadeia, desde a captação do material até a produção final. Hoje fazemos uma big bag reciclando 120 garrafas de plástico. Esperamos que essa iniciativa incentive outros projetos de economia circular e sustentabilidade, eliminando o plástico virgem das operações”, afirmou o CEO da Packem no Brasil, Lázaro Eduardo dos Santos Neto.
O exemplo da Packem é um entre vários empreendimentos em solo paranaense que têm apostado forte em um setor que está cada vez mais em evidência devido à emergência global do clima, o que faz com que ações focadas na redução do desperdício e redução de emissão de poluentes seja cada vez mais urgente.
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LOGÍSTICA REVERSA – Entre os indicadores que colocam o Paraná como referência em economia circular e sustentabilidade estão os altos índices de coleta e destinação adequada do lixo e de reciclagem. Um relatório da verificadora independente de resultados Central de Custódia a partir de dados de 15 entidades que gerem a coleta de embalagens no Brasil mostrou que o Paraná recuperou 70 mil toneladas de embalagens pós-consumo no ano, atrás apenas de São Paulo, que tem uma população quatro vezes maior.
Atualmente, o Estado possui parcerias com quatro entidades gestoras, com vigências que vão até 2031, nas áreas de baterias de chumbo ácido e suas embalagens pós-consumo, lâmpadas pós-consumo, papel e celulose e embalagens de aço. Em 2023, foram contabilizadas 15 mil toneladas de baterias e 1,123 milhão de unidades de lâmpadas recolhidas.
No início de abril, a Votorantim inaugurou a sua primeira unidade exclusiva da Verdera, o ramo de negócios da empresa dedicada ao coprocessamento de resíduos, em Itaperuçu, na Região Metropolitana de Curitiba. O local tem capacidade de triturar 48 mil toneladas de resíduos por ano, quase o triplo da estrutura já existente anteriormente.
Com uma área de 4,4 mil metros quadrados, o galpão foi equipado com um triturador de resíduos de última geração para a destinação sustentável de materiais não recicláveis, como móveis, produtos paletizados e resíduos armazenados em tambores. Eles são tratados e transformados em energia limpa, com menor emissão de CO2, para produção de cimento na fábrica da Votorantim em Rio Branco do Sul.
De acordo com o gerente-geral da Verdera, Eduardo Porciuncula, a nova unidade de Itaperuçu tem capacidade de atender o setor produtivo do Estado. “O coprocessamento é uma tecnologia consolidada mundialmente, que elimina os resíduos de forma sustentável e não gera novos passivos ambientais. Com a nossa nova unidade, vamos apoiar as indústrias e empresas de todo o Paraná de forma consistente na prática de circularidade”, disse.
BIODIESEL – Instalado na Lapa, também na RMC, o Grupo Potencial possui a maior unidade produtora de biocombustível concentrada em uma só planta no Brasil. A companhia investiu R$ 1,7 bilhão na ampliação da estrutura, que tem como base de produção o óleo de cozinha usado (75%) e os resíduos de gordura animal (25%), o que resulta em um combustível menos poluente e auxilia no descarte correto dos materiais. Somente em 2023, o Grupo Potencial utilizou mais de 9 milhões de litros de óleo de cozinha usado na produção de biodiesel.
Com a determinação do Ministério de Minas e Energia de aumento no percentual do biocombustível de 12% para 14% na composição do diesel, a expectativa da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) é de que a demanda por esse insumo no mercado nacional suba para 8,9 bilhões de litros, um aumento de 22% na comparação com 2023.
Recentemente, a Potencial fechou uma parceria com uma grande rede de fast-food para o recolhimento semanal do óleo de cozinha usado nas lojas. “Hoje, nós compramos de fornecedores parceiros mais de 600 toneladas por mês de óleo de cozinha usado, que são entregues diretamente na usina dentro de um padrão de qualidade estabelecido. Agora, estamos tentando viabilizar projetos ligados diretamente com o consumidor final”, explicou o gerente comercial na Potencial Biodiesel, Caio Arakaki.
No início de abril, a Votorantim inaugurou a sua primeira unidade exclusiva da Verdera, o ramo de negócios da empresa dedicada ao coprocessamento de resíduos, em Itaperuçu. Foto: Geraldo Bubniak/AEN
BIOGÁS – Outra área de atuação que vem ganhando novos investidores no Paraná é a geração de energia a partir do gás metano emitido nos aterros sanitários. Em parceria com uma empresa suíça, a holding Ambiensys, de Curitiba, importou uma tecnologia para aterros de pequeno e médio porte que apresenta 95% de eficiência na produção de biogás.
A solução é personalizada de acordo com cada cliente e envolve sistemas de tanques de armazenamento em plantas modulares com contêineres para desgaseificação. Atualmente, há cerca de 450 unidades de destinação final de resíduos no Estado, sendo a maioria aterros sanitários.
De acordo com o Plano Nacional de Resíduos Sólidos, os lixões e aterros controlados precisam comprovar até o fim de 2024 o investimento em destinação correta dos resíduos das cidades, o que envolve a eventual expansão ou criação de novos aterros sanitários e a contratação de empresas especializadas nesse tipo de trabalho, o que deve aumentar a demanda pelos serviços de empresas como a Ambiensys.
“O metano é altamente nocivo para o meio ambiente, e com essa tecnologia a gente consegue captar esse gás, transformando um passivo ambiental em energia elétrica, o que é benéfico para todas as partes envolvidas”, argumenta o gerente de Novos Negócios do Grupo Ambiensys, Lucca Barros. “Essa parceria que firmamos vai ajudar a ampliar os índices de tratamento de resíduos do Paraná e do Brasil”.
O biogás e o biometano também têm se tornado alternativas financeiras viáveis para os pequenos e médios agricultores graças às políticas de incentivo do programa Paraná Energia Rural Renovável (RenovaPR), criado pelo Estado em agosto de 2021. O maior volume de recursos do programa até o momento foi para a instalação de sistemas de energia solar, mas 72 propriedades que trabalham com a criação de animais já instalaram usinas para a transformação os resíduos animais em biogás e biometano, totalizando quase R$ 60 milhões em investimentos.
Um dos casos mais recentes foi o de um suinocultor de Carambeí, nos Campos Gerais, que investiu mais de R$ 1 milhão para produzir biometano a partir dos dejetos dos porcos. O produto é vendido para abastecer a frota de caminhões da Coopercarga, que possui operações logísticas em nível nacional e internacional. Utilização do biogás em larga escala é um dos compromissos assumidos pelo Governo do Estado junto a diversas entidades paranaenses.
Outro exemplo é da Sanepar. A unidade de secagem de lodo da Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) Atuba Sul, em Curitiba, venceu recentemente o Prêmio Melhores do Biogás 2024 pela inovação do sistema. A inovação chave nesta planta é o uso de fontes de energia renovável, como biomassa (cavaco de madeira), lodo seco gerado no próprio processo e biogás, também produzido no tratamento do esgoto, para secar o lodo. Ou seja, a planta transforma resíduos em recursos energéticos, utilizando os princípios da economia circular e eficiência energética.
A Sanepar também entrega lodo de esgoto para agricultores usarem como adubo em suas terras. Em 2022, a Sanepar fez o repasse do produto, gerado nas estações de tratamento de esgoto, para 157 agricultores, um aumento de 74% em relação aos 90 atendidos no ano anterior.
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APOIO ESTADUAL – O Paraná conta com um Sistema Estadual de Informações sobre Resíduos Sólidos. As informações são trabalhadas por meio da plataforma digital Contabilizando Resíduos, para gestão e planejamento sobre os resíduos do Governo Estado, a qual foi instituída pela lei estadual nº 20.607/2021. Os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de embalagens têm até 31 de julho para preencher os dados na plataforma sobre as medidas que foram tomadas em 2023 em relação ao descarte e tratamento destes resíduos.
Em março, uma reunião com representantes de 149 municípios para tratar da logística reversa. O encontro foi coordenado pelo R-20, órgão consultivo criado pelo poder executivo paranaense para a implantação das políticas nacional e estadual de resíduos sólidos de forma compartilhada com os 399 municípios e os consórcios intermunicipais.
No último ano, a Secretaria de Estado do Desenvolvimento Sustentável (Sedest) também buscou ampliar a parceria para a logística reversa das embalagens de agrotóxicos pós-consumo. O objetivo é ter uma rastreabilidade maior das embalagens em circulação, visando que sejam descartadas de forma adequada.
Além disso, o Estado possui, atualmente, parcerias com entidades gestoras, com vigências que vão até o ano de 2031, nas áreas de baterias de chumbo ácido e suas embalagens pós consumo, lâmpadas pós-consumo, papel e celulose e embalagens de aço. Em 2023, foram contabilizadas 15 mil toneladas de baterias pós-consumo recolhidas e 1,123 milhão de unidades de lâmpadas.
Para além da regulamentação, as empresas também contam com incentivos oferecidos pela Invest Paraná. Um deles é o Programa de Aceleração de Soluções Sustentáveis (Invest Pass), que seleciona empresas que prestam serviços ligados à economia circular. O objetivo é dar visibilidade a elas, promovendo contatos e encontros com outras entidades do setor público e privado para oferta das soluções, além da possibilidade do desenvolvimento de projetos-piloto junto ao Governo do Estado.
“A maior parte das empresas que se inscreveram no Invest Pass trabalham com soluções em resíduos sólidos e construções sustentáveis”, explica o diretor de Desenvolvimento Econômico da Invest Paraná, Rogério José Chaves. “As empresas estão cada vez mais sob pressão para adotar práticas mais sustentáveis pelas demandas dos consumidores, preocupações com as mudanças climáticas e as regulamentações governamentais. Apoiar essas iniciativas ajuda a posicionar o Paraná como líder em sustentabilidade, atraindo novos investidores alinhados com esses valores”.
Entre as empresas que já integram o programa, está a curitibana Tech Girls, que desenvolve ações para mulheres de baixa renda. A empresa promove oficinas para confecção de peças artísticas feitas com lixo eletrônico e capacitações para recuperação de notebooks obsoletos, que são posteriormente cedidos às estudantes.
A Orbis Verdi, de Foz do Iguaçu, também recebe o acompanhamento da Invest Paraná. Na lista de serviços oferecidos pela empresa, estão o desenvolvimento de planos e treinamentos para a obtenção de certificados na área de ESG (sigla em inglês para Governança Ambiental, Social e Corporativa), proteção de nascentes e comercialização de créditos de carbono.
Outra inciativa coordenada pela Invest Paraná é o programa Vocações Regionais Sustentáveis (VRS), focada em pequenos produtores e empreendedores. Apesar de não ser o objetivo central, alguns projetos também contribuem com a economia circular, como a produção de adubo a partir de materiais orgânicos não aproveitados, o “Costurando o Futuro”, que envolve a remanufatura de roupas descartadas em Rio Branco do Sul, e o “Morretes Preserva”, que consiste na confecção de ecobags com materiais de piscinas e colchões infláveis descartáveis.
Sabrine Pereira, que idealizou o projeto Morretes Preserva, trabalhava com a limpeza de áreas verdes, rios e vias urbanas na cidade litorânea. “Nós coletávamos uma quantidade enorme de plástico que era enviado para reciclagem, mas os restos de piscinas e colchões, que são de fibra de vidro, acabavam indo para o aterro sanitário. Comecei a usar esse material na costura das ecobags e, com o apoio do VRS, desenvolvi novos produtos, encontrei novas fontes para captação do material e aumentei as vendas”, conta.